segunda-feira, 24 de setembro de 2012

O DILEMA DA ALTA DOS PACIENTES NEUROLÓGICOS NOS CENTROS DE REABILITAÇÃO E SERVIÇOS DE FISIOTERAPIA.


THE DILEMMA OF HIGH  OF NEUROLOGICAL'S PATIENTS IN REHABILITATION'S CENTERS AND PHYSICAL THERAPY SERVICES .

A concessão de alta do tratamento de pacientes neurológicos vem se mostrando um crescente dilema para os serviços de fisioterapia e centros de reabilitação.
Por um lado, os pacientes e familiares lutam pela manutenção do tratamento, muitas vezes motivados pela esperança de que um dia o convalescente irá se reestabelecer completamente, libertando-se das sequelas e, consequentemente, de suas limitações; pela integração social que a fisioterapia promove, sendo esta, em alguns casos, a única atividade da qual o paciente participa fora de casa; ou pelo conforto que o familiar sente em saber que o seu ente está recebendo algum tipo de cuidado. Por outro, a reabilitação prolongada costuma causar nestas pessoas uma relação de dependência, seja pela ligação afetiva que se forma, ou pela comodidade do sujeito de não ser reinserido no mercado de trabalho, pois enquanto estiver em tratamento recebe os benefícios previdenciários, transporte gratuito para cuidadores, etc. Estes fatores podem dificultar a decisão técnica de concessão da alta do indivíduo.
 Não são raras, portanto, as ocasiões em que o fisioterapeuta encerra o tratamento, e os pacientes recorrem aos médicos para reencaminhá-los; ou buscam a justiça, com o argumento de que a saúde é um direito fundamental, que deve ser garantido ininterruptamente e que o fisioterapeuta não poderá jamais dispensá-lo dos seus cuidados; também é bastante comum que estes pacientes façam uma espécie de rodízio nos diversos centros de reabilitação/fisioterapia de suas cidades. O resultado de tudo isto são serviços superlotados de pacientes neurológicos crônicos, sem prognóstico de recuperação; e filas imensas de pacientes agudos, necessitando de atendimento, correndo o risco de perderem seu tempo de plasticidade e, consequentemente, o potencial de reabilitação, pela morosidade de sua admissão ao tratamento.
Como já comentado em texto anterior, apesar da saúde ser um direito fundamental, extensivo a todos (princípio da universalidade), os recursos do Estado muitas vezes não são suficientes, ou não são adequadamente geridos para que se possa atender a todos de forma plena. Assim sendo, as equipes de reabilitação devem procurar estratégias que viabilizem a garantia de um mínimo de assistência digna à saúde dos usuários. Para isto, se faz necessário, além da melhoria estrutural dos locais de atendimento e da ampliação dos recursos humanos (o que nem sempre é possível), uma otimização na organização funcional destas instituições. Tal reestruturação deve ser pautada em alguns quesitos: critérios de elegibilidade, avaliação cinético funcional, objetivos terapêuticos bem definidos e o esclarecimento do paciente e do acompanhante.
Os critérios de elegibilidade devem funcionar como instrumentos capazes de facilitar a dinâmica dos tratamentos. Sua classificação é normalmente fundamentada em aspectos formais, ou seja, aqueles expressos no regimento do centro ou serviço de reabilitação; e cinético-funcionais, aqueles determinados pelas condições clínicas, funcionais e pela evolução do paciente.
A partir desta divisão, os indivíduos podem ser elencados nas seguintes categorias: (1) Elegível para o tratamento: quando o paciente e os familiares têm expectativas adequadas quanto ao processo de reabilitação; não existem aspectos sociais ou cognitivos e emocionais que impeçam a adesão ao tratamento; há prognóstico de ganhos funcionais e o sujeito se encontra clinicamente estável. (2) Elegível parcialmente para o tratamento: quando há a possibilidade, a partir de intervenções específicas, de trazer benefícios ao paciente, mesmo quando este apresente quesitos que indiquem inelegibilidade. Estão incluídos, nesta perspectiva, pessoas com histórico de alcoolismo ou psicopatologia ativa; aqueles que apesar de terem completado o programa de reabilitação em outros centros (não havendo, portanto, indicação de repetição do tratamento), podem ser admitidos no serviço para controle de situações específicas (dor, adaptação de uma nova órtese, prótese, equipamento auxiliar de locomoção, cadeira de rodas); ou àqueles que sofreram novas demandas. Nestes casos, o paciente é eleito apenas para intervenções pontuais. (3) Inelegível no momento: quando a existência de quaisquer fatores de exclusão impossibilita os usuários de serem inseridos no programa de reabilitação ou no acompanhamento, porém, com a adequação desses fatores, tal condição poderá ser modificada no futuro próximo. Nessa categoria estão os pacientes com instabilidade clínica; comorbidades inadequadamente diagnosticadas ou controladas, que após um atendimento médico específico podem ser incluídos. Existem ainda aqueles que não dispõem de condução para levá-los à instituição. Contudo, com a intervenção do Estado ou de familiares e amigos, é possível conseguir o transporte, viabilizando o tratamento. (4) Inelegível: é o paciente que não tem prognóstico de reabilitação porque já completou o programa em outra ocasião ou em outro serviço; é aquele cuja família já está adequadamente treinada, ainda que alimentando falsas expectativas de ganhos somatórios com a realização de outras intervenções; ou aquele paciente cujas condições clínicas, sociais ou psicológicas definitivamente não permitem a participação no programa de reabilitação ou em intervenções terapêuticas pontuais.
Durante a triagem, é importante a realização de esclarecimentos sobre a impossibilidade de tratamento permanente, devendo ser apresentada uma previsão de sessões baseadas em objetivos terapêuticos, na colaboração e participação do paciente e na natureza da patologia da qual necessita cuidados. Propõe-se, por exemplo, uma expectativa de 3 meses de terapia para pacientes com paralisia facial, 6 meses para tratamento de outras doenças neurológicas periféricas, 10 meses para doenças piramidais (AVC, TRM, TCE, etc), e 12 meses para as doenças degenerativas/progressivas e extrapiramidais. Apesar de razoáveis, estes prazos devem ser flexíveis, e o profissional juntamente com o paciente e seu acompanhante, devem se esforçar para cumprirem os objetivos propostos à reabilitação neste período.
Finalmente, uma boa avaliação e um intenso trabalho de orientação, aliados ao empenho do paciente com o tratamento, servirão como termômetro para o fisioterapeuta poder decidir, com segurança, uma alta participativa, consciente e eficaz.
Observados estes critérios, é possível uma maior eficiência no processo de reabilitação dos pacientes neurológicos, uma vez que tais medidas resultarão em um aumento na qualidade da assistência, melhor organização das demandas e, consequentemente, maior celeridade no atendimento daqueles que integram as intermináveis listas de espera.

GLEIDSON FRANCIEL RIBEIRO DE MEDEIROS: Fisioterapeuta especialista em avaliação cinético funcional, fisioterapeuta do Hospital Universitário Onofre Lopes – HUOL/UFRN, Fisioterapeuta do Centro de Reabilitação Adulto – CRA, Preceptor da Residência Multiprofissional em Saúde do HUOL/UFRN, autor do livro: GUIA ILUSTRADO DE CINESIOTERAPIA NEUROLÓGICA BÁSICA, Aluno do curso de Direito da UFRN.